segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Texto do Coletivo Mapa Xilográfico para "Não Consta no Mapa"


por Tábata Costa

Entre julho e março de 2014 o Coletivo Mapa Xilográfico realizou um conjunto de oficinas de intervenções urbanas com o Coletivo Território B. Ao longo de cerca de 20 encontros de aproximadamente quatro horas cada (total de 80 horas) levamos para discutir diversas referências em registros audiovisuais, livros e textos de artistas e grupos que utilizam da intervenção urbana, performance, instalação e conceitos da arte contemporânea como estratégia de aproximação do espaço urbano, de questões sociais como o direito à cidade e questionamentos sobre o próprio circuito de arte: o livro Elogio aos Errantes, de Paola Berenstein; o grafiteiro e artista visual Banksy; GIA - Grupo de Interferência Ambiental, de Salvador (BA).

Levamos também registros e reflexões a partir de performances e intervenções que realizamos nos últimos 6 anos. Algumas dessas ações (tanto nossas quanto de outros artistas que nos inspiram) foram levadas como propostas a serem realizadas pelos participantes das oficinas, e que como: proposições de Yoko Ono (do livro Grapefruit) e derivas a partir das inquietações sobre a relação dos habitantes com a cidade levantadas pelos situacionistas.

Os primeiros experimentos coletivos foram realizadas no sentido de praticar a percepção corporal de si e do outro com relação à cidade através de ações poéticas não-cotidianas.

Depois foram feitas constantes provocações para que os participantes criassem intervenções urbanas e interações no espaço urbano a partir de parâmetros diferentes da representação e dos que são usados em seu processo de pesquisa e criação de teatro de rua, dando preferência para ações simples em relação direta com o local e/ou as pessoas.

Segue descrição das ações criadas pelos participantes da oficina, todas realizadas no centro de São Paulo:

- Coro

A partir da observação do ambiente próximo à ocupação no prédio Columbus, o grupo de participantes unido em bloco percorreu os calçadões de modo que a cada momento um deles iniciava uma ação corporal e/ou sonora que era amplificada/repetida pelos outros, resultando em moemntos bem musicais. Era como um coro que amplificava movimentos que complementavam ou se contrapunham à dinâmica e ao ritmo local.

A partir da reação de pessoas que vivem e trabalham nesses locais que questionaram o que o grupo fazia, houve uma importante reflexão posterior sobre a proposta e as barreiras entre arte e público na cidade.

- Corrida

Foram duas ações seguidas, realizadas numa madrugada no meio da semana no centro de São Paulo. Na varanda do apartamento de uma das participantes, todos ficaram sentados em silêncio atentos aos sons durante 15 minutos ininterruptos. Logo depois foi feita uma corrida coletiva pelas ruas, também durante 15 minutos ininterruptos. Com essas ações simples pudemos captar mais a noite da cidade de perspectivas diversas de nosso cotidiano.

- Quadrado autônomo

Foi um conjunto de ações espontâneas e outras mais performáticas realizadas dentro de um espaço quadrangular demarcado no chão de um largo de grande circulação de pessoas em que foram levados diversos elementos como objetos, roupas, comidas e almofadas compondo um espaço atraente e convidativo a quem passava e onde brincava-se com o exercício da liberdade de estar, dialogar, compartilhar com os transeuntes. Muita gente parou por ali para interagir, conversar, contar histórias e comer com os participantes. Suscitou interessante reflexão sobre os limites do espaço público.

- Mulheres Secas

A partir do problema da falta de água na cidade e tendo como referências como o trabalho das lavadeiras de roupas, fizemos uma ação nas proximidades das nascentes do Rio Saracura, no bairro do Bixiga. Usando baldes cada participante esfregava roupas usando terra e pedras dos baldes e depois compartilhava memórias que remetiam à secura e à infertilidade. Foi uma troca coletiva muito rica. O íntimo e o público, o cotidiano e o ritual se atravessaram e foram trazidos à tona naquele local simbólico. As nascentes do Saracura estão secas.


Intercalávamos as ações na rua com reuniões de avaliação e reflexão sobre esse percorrer a cidade, os limites entre intervenção urbana, improvisação e cena teatral, a interferência do registro audiovisual na ação, a potência do instante.
Foi um processo muito produtivo em que os participantes se dispuseram a experimentar os pontos de vista diversos que foram propostos, a arriscar ações menos programadas e a rever as possibilidades da ação artística ou ritualística coletiva no espaço urbano.


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